AINDA HÁ JUÍZES EM BRASÍLIA
Conta-se que no século XVIII o Rei da Prússia, Frederico III (O Grande), construiu um palácio de verão em uma pequena cidade nos arredores de Berlim, ficando próximo do Moinho de vento de Sans-Souci. Com a intenção de aumentar as dimensões de seu Castelo, necessitava demolir o referido moinho.
Todavia, o seu proprietário não aceitou as diversas propostas do reino. O Rei, então, o chamou ao castelo e o ameaçou, inclusive no sentido de desapropriar o imóvel sem qualquer indenização. Nesse momento o velho homem teria dito ao Déspota: “Ainda há juízes em Berlim!” Apesar das variações de como teria ocorrido esse episódio, a frase tornou-se famosa por representar a independência e autoridade do Poder Judiciário.
Lembrei-me dessa frase quando li neste Jornal a intenção de alguns parlamentares de se alterar a Constituição Federal no que tange à distribuição dos Royaties do Petróleo, diante da decisão proferida pela Min. Carmen Lúcia do STF nas ADI´s ajuizadas pelo ES e RJ, suspendendo a eficácia de alguns dispositivos da Lei 12.734/2012, (vetados pela Presidente da República) com o falacioso argumento de que “a maioria pode tudo.”
O Ilustre parlamentar esqueceu-se que o Supremo Tribunal também pode declarar a inconstitucionalidade de emendas feitas à Constituição Federal, seja por vício formal (procedimento) ou vício material (incompatibilidade com as denominadas cláusulas pétreas, com p. ex. o art. 5º, inciso XXXVI).
Assim, ao contrário do afirmado pelo Ilustre parlamentar, em um País Democrático de Direito, a maioria não pode tudo, pois temos uma Constituição que regula e delimita os Poderes.
Conforme bem salientou recentemente o Professor e Procurador do Estado do RJ, Luís Roberto Barroso, quando comentou a decisão do STF; “Embora no Brasil atual existam algumas superposições entre o direito e a política, direito e política são coisas diferentes. Política se pauta pela vontade da maioria, mas mesmo a vontade da maioria tem um limite, que é o estabelecido na Constituição. A política cria o direito ao elaborar a Constituição, mas depois a Constituição limita a política. E foi exatamente isso o que aconteceu.”
Dessa forma, após toda a manobra empreendida pelos Estados não produtores para derrubada dos vetos presidenciais e, após publicada a lei com os artigos vetados, os mesmos dispositivos terem sido suspensos pelo STF, por considerá-los inconstitucionais, é totalmente absurda, irracional e despropositada a intenção de se alterar a Constituição com esse mesmo fim, além de profundo desrespeito com a Suprema Corte Brasileira.
Parafraseando o moleiro da antiga Prússia, posso dizer a “Sua Excelência” que “ainda há Procuradores preparados para defender os legítimos interesses de seus Estados e que ainda há juízes em Brasília”.
GUSTAVO CALMON HOLLIDAY
PROCURADOR DO ESTADO DO ES – Chefe da Procuradoria de Petróleo e Gás da PGE-ES